É preciso conhecer a história da Educação Especial para entender o que é Inclusão Escolar e a reviravolta complexa, mas possível, que este novo paradigma vem gerando. Vários elementos históricos contribuíram para o desenvolvimento da Educação Especial no Brasil. Mesmo as experiências modestas, ou as que fracassaram, representam contribuição. Elas nos levam a reflexão e a busca pela superação do que, hoje, consideramos errado.
A história da Educação Especial, parece ter começado pela criação Instituto dos Meninos Cegos no período imperial, atualmente o Instituto Benjamim Constant, e dois anos depois, em 1856, o Instituto dos Surdos-Mudos, atual INES (Instituto Nacional de Educação de Surdos). Também não podemos deixar de citar que no decorrer da década de 20, no Brasil, várias reformas educacionais estaduais foram empreendidas dentro dos princípios da Escola-Nova. Professores psicólogos europeus foram trazidos para ministrar cursos aos educadores brasileiros, influenciando os rumos da Educação Especial nacional. Houve a fundação do Instituto Pestalozzi (1926), instituição especializada no atendimento às pessoas com deficiência mental, onde em 1945, foi criado o primeiro atendimento educacional especializado às pessoas com superdotação, por Helena Antipoff. Além disso tivemos a fundação da primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE.
A partir da década de 60 os serviços de reabilitação cresceram e se desenvolveram devido a um maior incentivo e apoio oferecido pelo governo. Portanto novos e importantes elementos históricos surgiram, como a Lei de Diretrizes e Bases 4024/61, que aponta o direito dos “excepcionais” à educação, preferencialmente dentro do sistema geral de ensino. Já a Lei nº 5.692/71, que altera a LDBEN de 1961, ao definir “tratamento especial” para os alunos com “deficiências físicas, mentais, os que se encontram em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados”, não promoveu uma organização de um sistema de ensino capaz de atender às necessidades educacionais especiais e acabou reforçando o encaminhamento dos alunos para as classes e escolas especiais, mas mesmo assim, contribuiu como elemento histórico importante, pois nos levou a refletir e a buscar soluções. Como também foi a criação em 1973, do Centro Nacional de Educação Especial – CENESP -responsável pela gerência da educação especial no Brasil impulsionando ações educacionais voltadas às pessoas com deficiência e às pessoas com superdotação, mas ainda configuradas por campanhas assistenciais e iniciativas isoladas do Estado.
Importantíssimo para Educação Especial é a Constituição Federal de 1988 que tem entre seus objetivos fundamentais “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art.3º, inciso IV). No artigo 205, define a educação como um direito de todos, garantindo o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. No seu artigo 206, inciso I, estabelece a “igualdade de condições de acesso e permanência na escola” como um dos princípios para o ensino e garante, como dever do Estado, a oferta do atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208).
Também de grande importância é o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei nº 8.069/90, no artigo 55, veio reforçar os dispositivos legais supracitados ao determinar que “os pais ou responsáveis têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”.
Também nessa década, não podemos deixar de citar a contribuição de documentos como a Declaração Mundial de Educação para Todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994) que passam a influenciar a formulação das políticas públicas da educação inclusiva.Também em 1994, A Política Nacional de Educação Especial, passou a orientar o processo de “integração instrucional” que condiciona o acesso às classes comuns do ensino regular àqueles que “(...) possuem condições de acompanhar e desenvolver as atividades curriculares programadas do ensino comum, no mesmo ritmo que os alunos ditos normais” (p.19).
Na história mais recente, a educação especial tem a contribuição da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96, principalmente o artigo 59, que preconiza que os sistemas de ensino devem assegurar aos alunos currículo, métodos, recursos e organização específicos para atender às suas necessidades; assegura a terminalidade específica àqueles que não atingiram o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências; e assegura a aceleração de estudos aos superdotados para conclusão do programa escolar. Também define, dentre as normas para a organização da educação básica, a “possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado” (art. 24, inciso V) e “[...] oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames” (art. 37).
Em 1999 a educação especial é definida como uma modalidade transversal a todos os níveis e modalidades de ensino, enfatizando a atuação complementar da educação especial ao ensino regular, através do Decreto nº 3.298 que regulamenta a Lei nº 7.853/89.
Acompanhando o processo de mudança, as Diretrizes Nacionais para a Educação especial na Educação Básica, veio a Resolução CNE/CEB nº 2/2001, artigo 2º, que determina que todos os alunos devem ser matriculados nos sistemas de ensino e que cabe as escolas se organizarem para o atenderem aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando a todos condições necessárias para uma educação de qualidade.
O Plano Nacional de Educação – PNE, Lei nº 10.172/2001, destaca que “o grande avanço que a década da educação deveria produzir seria a construção de uma escola inclusiva que garanta o atendimento à diversidade humana”.
A Convenção da Guatemala (1999), promulgada no Brasil pelo Decreto nº 3.956/2001, afirma que as pessoas com deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as demais pessoas, definindo como discriminação com base na deficiência toda diferenciação ou exclusão que possa impedir ou anular o exercício dos direitos humanos e de suas liberdades fundamentais.
A Resolução CNE/CP nº 1/2002, que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, define que as instituições de ensino superior devem prever, em sua organização curricular, formação docente voltada para a atenção à diversidade e que contemple conhecimentos sobre as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais.
A Lei nº 10.436/02 reconhece a Língua Brasileira de Sinais - Libras – como meio legal de comunicação e expressão.
A Portaria nº 2.678/02 do MEC aprova diretrizes e normas para o uso, o ensino, a produção e a difusão do sistema Braille em todas as modalidades de ensino.
Em 2003, é implementado pelo MEC o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, com vistas a apoiar a transformação dos sistemas de ensino em sistemas educacionais inclusivos, promovendo um amplo processo de formação de gestores e educadores nos municípios brasileiros para a garantia do direito de acesso de todos à escolarização, à oferta do atendimento educacional especializado e à garantia da acessibilidade.
O Ministério Público Federal, em 2004, com o objetivo de disseminar os conceitos e diretrizes mundiais para a inclusão, reafirmando o direito e os benefícios da escolarização de alunos com e sem deficiência nas turmas comuns do ensino regular, publica o documento “O Acesso de Alunos com Deficiência às Escolas e Classes Comuns da Rede Regular.”
O Decreto nº 5.296/04 regulamentou as Leis nº 10.048/00 e nº 10.098/00, estabelecendo normas e critérios para a promoção da acessibilidade às pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Nesse contexto, o Programa Brasil Acessível, do Ministério das Cidades, é desenvolvido com o objetivo de promover a acessibilidade urbana e apoiar ações que garantam o acesso universal aos espaços públicos. Já o Decreto nº 5.626/05, que regulamenta a Lei nº 10.436/2002, visa o acesso à escola dos alunos surdos e dispõe sobre a inclusão da Libras como disciplina curricular, a formação e a certificação de professor, instrutor e tradutor/intérprete de Libras, o ensino da Língua Portuguesa como segunda língua para alunos surdos e a organização da educação bilíngüe no ensino regular.
Em 2005, é implantado os Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação –NAAH/S em todos os estados e no Distrito Federal.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU em 2006 e da qual o Brasil é signatário, estabelece que os Estados-Partes devem assegurar um sistema de educação inclusiva em todos os níveis de ensino, em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social compatível com a meta da plena participação e inclusão, adotando medidas para garantir que as pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino fundamental gratuito e compulsório, sob alegação de deficiência. Além disso, as metas tentam garantir que as pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino fundamental inclusivo, de qualidade e gratuito, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem (Art.24). A Secretaria Especial dos Direitos Humanos, os Ministérios da Educação e da Justiça, juntamente com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO, lançam, neste mesmo ano, o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, que objetiva, dentre as suas ações, contemplar, no currículo da educação básica, temáticas relativas às pessoas com deficiência e desenvolver ações afirmativas que possibilitem acesso e permanência na educação superior.
Em 2007, é lançado o Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, reafirmado pela Agenda Social, tendo como eixos a formação de professores para a educação especial, a implantação de salas de recursos multifuncionais, a acessibilidade arquitetônica dos prédios escolares, acesso e a permanência das pessoas com deficiência na educação superior e o monitoramento do acesso à escola dos favorecidos pelo Beneficio de Prestação Continuada – BPC. E para a implementação do PDE é publicado o Decreto nº 6.094/2007, que estabelece nas diretrizes do compromisso Todos pela Educação, a garantia do acesso e permanência no ensino regular e o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, fortalecendo seu ingresso nas escolas públicas.